PF indicia Lula, Palocci, Marisa Letícia e mais quatro na Lava-Jato
Ex-presidente é acusado
de corrupção passiva em casos que tratam de suposta propina da Odebrecht
─ Jornal O Globo/13-12-2016
A Polícia Federal sustenta que o pagamento de propina pela Odebrecht em
troca de favores do então governo do PT levou ao indiciamento, nesta
segunda-feira, do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, da ex-primeira-dama
Marisa Letícia, do ex-ministro Antônio Palocci e de outras quatro pessoas. Lula
responderá por crime de corrupção passiva. Os demais são acusados pelo crime de
lavagem de dinheiro.
O
indiciamento trata de dois casos distintos. O primeiro diz respeito à compra de
um terreno que seria utilizado para a construção da sede do Instituto Lula. O
segundo é sobre o aluguel do apartamento localizado em frente ao que o
ex-presidente mora, em São Bernardo Campo.
Os dois
casos corriam em inquéritos diferentes, mas o delegado Márcio Adriano Anselmo,
que produziu o indiciamento, considerou que deveria unir as duas investigações,
por se tratarem de fatos correlatos.
ANTÔNIO PALOCCI
De acordo
com as investigações, o ex-ministro Antônio Palocci operava distribuindo a
propina da Odebrecht ao Partido dos Trabalhadores (PT). A PF diz que ele usava
a influência para atuar em favor dos interesses da empreiteira junto ao governo
federal.
Em troca da
propina, Palocci teria trabalhado em Brasília pela aprovação de benefícios
fiscais e pela edição de medidas provisórias (MPs), que beneficiaram empresas
do grupo Odebrecht, como a Braskem. O ex-ministro também teria facilitado a
liberação de linhas de financiamento do BNDES para projetos da construtora em
Angola, na África. Entre as provas que o delegado apresenta para sustentar essa
tese estão uma série de e-mails trocados entre Marcelo Odebrecht, entre outros
diretores da empreiteira e Branislav Kontic, então assessor do ex-ministro e
Nelson Machado, que compunha a equipe do ministério da Fazenda.
Numa das
mensagens, em 5 de outubro de 2009, Mauricio Roberto de Carvalho, executivo da
Braskem, envia uma sugestão de texto a Machado em que trata do parcelamento de
débitos de IPI. No e-mail, o executivo da Braskem pergunta ao membro da equipe
do ministério da Fazenda "se a redação atende", o que na visão do
delegado sugere que havia interferência da empresa na edição da medida.
Palocci,
afirma Ancelmo, é citado como "chefe" nos e-mails e como
"italiano", nas planilhas do "departamento de propina" da
empresa. Nos e-mails, Marcelo Odebrecht também faz pedidos e pede reuniões com
GM, o que para a PF seria uma referência ao ex-ministro da Fazenda, Guido
Mantega.
O delegado
também sustenta que o ex-ministro interferiu numa licitação da Petrobras em
favor da Odebrecht para a compra de 21 navios-sondas para exploração do
pré-sal. A PF também juntou ao inquérito um e-mail de 4 de abril de 2011, em
que Rogério Andrade, então diretor da Odebrecht, dá ciência ao presidente
Marcelo Odebrecht que esteve com o diretor da Petrobras Renato Duque e que este
mencionou que tem compromisso com o PT de permanecer no cargo até
"solucionar a contratação das 21 sondas".
Para a PF,
Lula seria beneficiário da propina da empreiteira. Esse dinheiro ilícito teria
sido usado para a construção de uma sede do instituto Lula, cuja propriedade
foi adquirida pela DAG Construções, uma espécie de preposto da Odebrecht.
Já o caso do
apartamento que fica em frente onde Lula mora teria sido comprado por Glaucos
da Costamarques (primo do pecuarista José Carlos Bumlai) e alugado ao
ex-presidente, em um contrato celebrado no nome da ex-primeira-dama, Marisa
Letícia. No entanto, de acordo com a investigação, nunca houve qualquer
pagamento por parte do ex-presidente, que utiliza o imóvel, pelo menos, desde
2003.
O imóvel
fora comprado por Glauco por R$ 503 mil. No entanto, a quebra de sigilo da PF
demonstrou que antes da aquisição, ele recebeu R$ 800 mil da empresa DAG
construtora, que na ocasião também pagou R$ 234 mil ao escritório de advocacia
de Roberto Teixeira, advogado de Lula.
A polícia
diz que a operação foi realizada para ocultar o verdadeiro dono do imóvel. Para
o delegado, o ex-presidente Lula é quem é dono do local, que também teria sido
adquirido por meio de propina obtida junto à Odebrecht, com a intermediação de
Palocci.
Glauco,
Roberto e Branislav também foram indiciados pela PF e Demerval de Souza Gusmão
Filho, que é dono da empresa DAG Construtora, também foram indiciados.
O delegado
responsável pelo indiciamento afirmou que deixou de indiciar Marcelo Odebrecht,
porque o executivo já responde por corrupção ativa, crime que lhe poderia ser
imputado novamente. Da mesma forma, a Polícia Federal também decidiu deixar de
fora do indiciamento o pecuarista José Carlos Bumlai, por falta de "novos
elementos que amparassem a participação do mesmo nos fatos".
OUTRO LADO
Por
telefone, a assessoria de imprensa do Instituto Lula informou ao “G1” que o
ex-presidente aluga o apartamento vizinho ao seu. Também afirmou que o
instituto funciona no mesmo local há anos e que nunca foi proprietário do
terreno em questão.
A defesa do ex-presidente Lula afirmou que a transação envolendo o
terreno onde supostamente seria edificado o Instituto Lula é um "delírio
acusatório" "Nós apelidamos de transação imobiliária Manoel Bandeira,
o nosso poeta. Uma transação que teria sido feita, mas que nunca foi. Portanto,
estamos orbitando na esfera da ficção", afirmaram os advogados.
A defesa de Palocci e Kontic diz que nada se conseguiu que
pudesse incriminar os dois no primeiro processo a que eles respondem.
"Então, este artifício acusatório não pode ser levado a sério, porque
ambos nada têm a ver com o Instituto Lula, terrenos ou locação de apartamentos
em São Bernardo do Campo". Os advogados também reclamaram da atuação
policial. "Até quando teremos de aguentar essas manobras da acusação, que
não encontram na língua portuguesa um adjetivo qualificativo que lhes faça
justiça?".